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Qual o significado das tentações de Jesus?


No ciclo litúrgico, a Quaresma é um tempo de preparação para a Páscoa e dura cerca de quarenta dias litúrgicos, ou seja, quatro semanas. Esse tempo simbólico relembra aos fiéis o período que Jesus esteve no deserto se preparando para o início de sua vida pública. O número 40 representa na tradição bíblica mudança, transformação, início de uma etapa da missão. O número 40 está muito presente na Sagrada Escritura: nos dias do dilúvio, no tempo de espera pelas tábuas da Lei, nos anos que o povo passa no deserto, na marcação dos anos jubilares. Jesus ao iniciar o seu ministério precisa passar pelas tentações no deserto. Levando para lá pelo Espírito, após 40 dias, ele sente fome. A descrição das tentações parece ser mais interior do que exterior, uma vez que muitas imagens se desenvolvem como uma espécie de visão ou alucinação. Na narrativa do evangelho de Mateus, Jesus sofre três tentações pelo diabo e cada uma delas tem um grau de dificuldade maior. A primeira tentação relaciona-se com a providência divina: o diabo propõe que Jesus transformasse as pedras do deserto em pães, para matar a sua fome. A sutileza da tentação está colocada indiretamente, como pode o messias, filho de Deus, passar fome e não ser cuidado por Deus? Onde estaria Deus neste momento de angústia? Não seria melhor esquecer esse Deus e ser você mesmo o deus da sua vida? A esta tentação Jesus responde “nem só de pão vive o homem, mas de toda Palavra que sai da boca de Deus”, que mesmo não percebendo Deus, ele tem certeza, por meio de sua Palavra, que ele não será abandonado. Ele precisa confiar e se entregar, mesmo na angústia.

A segunda tentação, é topograficamente mais alta, se passa em Jerusalém, no ponto mais alto do Templo. O diabo parte da Palavra de Deus, do salmo 91 (90): “se és filho de Deus, jogue-se daqui pra baixo...”, pois a Sagrada Escritura diz que os anjos não deixariam os seus pés tropeçarem. Novamente uma sutileza: nesta relação entre a humanidade e Deus, deveríamos impor que Deus cumpra para nós aquilo que Ele determinou, no nosso tempo e da nossa forma. Este Deus, de alguma forma, cumpriria as nossas vontades, e, com certeza, não seria Deus, mas um ídolo. Não é Deus que tem que cumprir nossas vontades, mas nós que devemos cumprir as suas e sermos humildes para esperar o seu tempo, o seu modo de realizar seu projeto em nossa vida. Jesus não quer se relacionar com Deus como se ele fosse um ídolo, não quer colocar o Senhor à prova.

A terceira tentação é a mais alta topograficamente, em um alto monte, que a tradição acredita estar em Jericó, no chamado Monte das Tentações. Esta tentação também é a mais dura, uma vez que coloca Jesus diante de seu futuro. Como que em uma visão, o diabo mostra os reinos deste mundo e tudo o que de prazeroso eles possuíam. E, então, faz a sua proposta de dar o poder sobre tudo isso, uma vez que Jesus reconheça-o como seu deus. A proposta é deixar de lado o projeto do Reino de Deus pelo projeto do anti-deus; que ele abandone sua caminhada em prol da glória e do reconhecimento que poderá conquistar. Em meio ao deserto, Jesus tem que decidir se iniciará seu movimento; se ele irá até as últimas consequências... Se as privações, as perseguições, a angústia de se ver sozinho em meio aos seus algozes valeriam a pena... Neste momento, Jesus exclama “afasta-te de mim Satanás”, a mesma expressão que usa para Pedro quando este o repreende por falar de sua paixão. “Satanás” (ha Satan) significa em hebraico “aquele que se opõe e coloca obstáculos às nossas melhores decisões”. É a força que nos coloca à prova, diante da nossa vontade livre de seguir um objetivo mais elevado como pessoas humanas. Só existe um Deus para Jesus. Este Deus, mesmo que não seja plenamente compreensível, que, muitas vezes, não o percebamos nos momentos de sofrimento e angústia, que não coloca como o mais importante a glória pessoal e o reconhecimento dos homens, misteriosamente está mais perto que imaginamos. Ele nos impulsiona para o bem e desafia o nosso amor todas as vezes que nos deparamos com uma realidade desumana a nossa volta. As tentações de Jesus não são apenas no começo de sua caminhada, mas ao longo de toda a sua vida. Elas se repetem com menor e maior intensidade e chegam ao seu ápice quando ele pede para que o Pai afaste dele o cálice do sofrimento; quando ele reza o Salmo 22 “meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?”. Mesmo não sentido o Pai, ele teve que acreditar que não estava só, que não estava sendo esquecido, que era amado. Essa “ausência” de Deus, talvez seja a maior tentação de nossos tempos, mas, com certeza, ela é limitação do nosso olhar e não de Deus. Muitas vezes queremos que Deus se molde a nossa vontade, e esquecemos que Deus é totalmente livre. E, na sua liberdade, juntamente com a nossa liberdade, Ele sabe o que será melhor para cada um de nós. Precisamos de entrega, paciência, sobretudo, de fé. A quaresma nos convida a esse movimento. A uma conversão profunda de nosso modo de pensar e agir, para que possamos fazer parte deste caminho de Jesus, passar pelo deserto das tentações e voltar fortificados pela força de seu Espírito.

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